Bueiros paulistanos inspiram vozes destiladas..

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11 de dezembro de 2013

Nove e meia



Todo dia as nove e meia o pombo voava para seu ninho.
As nove e meia os alunos saiam para os pátios
e brincavam de escrever o futuro
em apertos de mãos, abraços, segredos e sorrisos.

As nove e meia um eco de vozes se espalhava pelas copas das árvores
as crianças da zeladora apoiavam o queixo no portão.
E viam a algazarra dos outros as nove e meia
As nove e meia o aroma de comida invadia o refeitório
e as pessoas sentavam juntas à mesa... as nove e meia

Hoje voltei à escola
seus corredores estavam cheios de um silêncio fúnebre
um ar frio, fraco e melancólico.
Para onde foram todos? Fugiram?
E para onde fogem os que não sabem onde ir?

Ando em meio a quietude e ouço o choro dos muros
O pombo anda despreocupado e vagaroso como eu
as crianças da zeladora me sorriem, felizes por ver viva'lma
Até elas sentem o vazio.

Olho de perto as penas roçando o chão no vento brando,
Olho de perto a mancha de pés na parede, a lousa apagada
o rabisco de “eu te amo” na madeira surrada do batente
O amor esqueceu-se no pé da porta

Olho a bola presa no telhado, querendo despender-se
Olho a sala vazia vista da lousa
Arrumadas, solitárias e frias as carteiras sem o calor humano
O calor perdeu-se no piso limpo


E então ouço o farfalhar de uma pomba em voo
E ela passa apressada pela janela inquieta. É nove e meia.
A escola é invadida bruscamente por todas as memórias possíveis...
subindo pelas paredes e ocupando as raízes das árvores,
os cestos de lixo e as quinas recônditas
Inspiro fundo e encho meu pulmão de histórias. É nove e meia.

A quadra vibra lembrando dos tombos,
os muros se inflam recordando os beijos lânguidos
as paredes trocam os segredos ouvidos por tantos anos
o banheiro desenha no azulejo os nomes confidenciados em sussurro

É nove e meia
Os alunos estão lá....milhares
seus sorrisos estão lá...suas lágrimas
a poesia está lá e mais as lembranças todas.
Há muita bola para ser chutada, muito giz para ser gasto
muito chão para ser pisado e tempo a ser vivido
as nove e meia

a escola estará sempre cheia as nove e meia.

2 comentários:

Pensamentos disse...

Triste... Tu falas do silêncio ensurdecedor encontrado numa escola vazia, mas que antes, dias atrás, estava repleta de vários acontecimentos, dentre eles, nove e meia. Admirável sua descrição.

vitor disse...

Penso que isto deve valer tanto para quando voltamos à escola que estudamos, quanto para a situação docente, na qual também se vive a vida do prédio.
=) gracias

O lado de dentro...sublime

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