Bueiros paulistanos inspiram vozes destiladas..

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24 de julho de 2007

A magia Clara (V) - Co-incidências


Não há saída!! A terra é fim de tudo! Dizia o vô de Clara desde que ela era pequena. As palavras martelavam em sua cabeça enquanto o caixão cumpria a frase e seu avô era regado pela terra úmida. Curiosamente o padre orava na lápide. Clara nunca fora cética como o vô, se perguntava em momentos de escuridão no quarto, se aquele vazio imperador não significava algo, se aquilo tinha sentido. Clara acreditava no destino, na morte pré-determinada e que cada pessoa tinha sua hora e vez. Acreditava que o destino lhe faria conhecer uma pessoa maravilhosa e que talvez pudesse ser feliz com ela por um tempo. Acreditava..... a solidão, o desalento, as desilusões de sua vida e as suas perdas enterraram o vislumbre. Clara se tornou uma pessoa mais astuta, mais pensativa, mais quieta, reservada e sensível. Passou a encarar a morte com uma certa naturalidade casual. Mas o caso era outro, um corpo jazia em sua frente e pela força de seu dedo no gatilho. O rosto branco tingido do corpo com os olhos arregalados fez Clara entrar em choque...nada, não saia mais nenhuma palavra de sua boca. O que Rodrigo pôde ver quando se recuperou da surra foi Clara com os olhos fixos nos de Dudu, encostada na laleira, braços em volta das pernas e uma corredeira fina e constante dos dois globos. Rodrigo tinha o olho inchado e a sobrancelha cortada. Acompanhou a cena de outro ângulo, viu a bala rasgar o peito da figura escura e romper sangue. O corpo caiu para o lado. Rodrigo estava agora se arrastando em direção a Clara. Ele se pôs do seu lado, ela não movia um músculo. Rodrigo passou os braços em volta dela, encostou o rosto sujo em seu ombro e observou aquele rosto:
Não é possível!!!! Eduardo!!!! – o susto foi enorme.
Clara virou o pescoço e com mesmo olhar distante fitou Rodrigo. Um encontro de olhos confusos, de sentimentos misturados. Aquele rapaz conhecia o primo dela, com o qual passou grande parte da infância. Talvez o acaso desse conta de confortar Clara.... não naquele momento. Sem esboçar nenhuma reação, Rodrigo ajudou Clara a se erguer, foram até a cozinha. Ele serviu dois copos d’água, beberam em silêncio. Passou-se alguns minutos até que o choro cessasse e a lucidez voltasse:
- Você conhecia meu primo da onde? A primeira voz depois de um bom tempo.
- Ele foi segurança de uma casa lá em Campos, eu ia direto, acabei ficando amigo dele.
Clara não respondeu, qualquer explicação lógica faria sentido naquele momento. Continuou com olhar fixo no lampião.
- Ele me falava muito de você, antes até de nos conhecermos naquela festa. Na verdade eu não era tão amigo do Carlos quando fui ao aniversário dele. Fui porque o Eduardo disse que eu deveria te conhecer. Sabe, eu me encantei por você naquelas descrições...eu estava saindo de uma deprê...sei lá pensei acho que vou nessa festa.
Mais uma vez Clara não disse nada, entretanto a configuração que as coisas tomaram formas era de uma coincidência muito grande. Clara estava mais do que transtornada, estava cansada, confusa e ao mesmo tempo admirava a ternura daquele rapaz despejando confissões sem necessidade.
- Ele era um cara muito gente boa! –Murmurou ainda Rodrigo
Qualquer vento faria a pedra do pranto rolar de novo ladeira abaixo. Clara umedeceu os olhos, conteve o choro com força.
- Que que agente vai fazer agora? – Perguntou Rodrigo – agente precisa dá um jeito.
- Precisamos sair daqui - Resposta seca.
- Mas para onde?
- Não sei, um hotel na beira da estrada, depois agente vê o que faz, aqui não têm condições de ficar.
Fez-se um silêncio:
- E o que fazemos com ele? – perguntou Rodrigo indicando com o nariz o corpo no chão.
Clara olhou para traz, viu o corpo, não respondeu.
Rodrigo a segurou pelo braço e foram para o carro. Ele abriu a porta do passageiro, ela entrou:
- Fique aqui, vou arrumar as coisas e já volto.
Ela permaneceu no banco do passageiro, enquanto ele carregava as coisas de volta no carro. Bateu pela última vez o porta malas, debruçou-se na janela, ameaçou abrir a porta, parou, olhou para a casa: “já volto”. Clara o viu se afastando, entrando na casa e logo depois saindo com as mãos no punho do corpo, arrastando ele para o canavial. Clara acompanhou o movimento pelos espelhos do carro. Ele largou o corpo de Dudu no meio do mato, fechou a porta da casa, entrou no carro, ligou e arrancou.
Foram até o primeiro motel da estrada, entraram e a força do cansaço venceu o transtorno das cabeças. Dormiram em silencio.
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Continua - penúltima parte terça-feira.

4 comentários:

Ju disse...

Olha eu aqui pra comentar mais um capítulo da intrigante história de Clara ...

Já te disse que adoro ler tudo que vem de vc né Vitor... e ao ler esse capítulo o sentimento não foi diferente... simplesmete adorei, aumentou ainda mais a minha angústia em saber qual será o final de tudo isso... e então quando o final chegar ficarei triste (ou não) por ter acabado (geralmente é o que acontece quando as coisas chegam ao final... elas acabam...rsrsrs)... Massssss possuo a esperança de que ainda vou ler outras e outras histórias que certamente virão!!!! Né?????????

Bjosss de quem te adora demais!

Anônimo disse...

Meu, isso ñ pode... qdo vc vai colocar o resto?? eu quero ver o final! qq vai acontecer????????
ah, mas ansiedades a parte...
leitura muito interessante, vc consegue instigar, causar ansiedade... sabe aquele livro q vc começa a ler e ñ consegue parar enquanto ñ termina.... nesse sentido eu m lembrei de "blecaute".
Mas vc escreve bem msm hein... e ficava c frescura p m mostrar...hehe
ah, como se ñ bastasse o assassinato de um...nosso caro Rodrigo ta fudido!

aguardo o fim.....
bjos**

Anônimo disse...

ah, e comentário a parte...
me identifiquei mto c ela nessa parte...
adorei: "a terra é o fim de tudo". me fez refletir mto....

Anônimo disse...

o que eu estava procurando, obrigado

O lado de dentro...sublime

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