Cada vez que recruto minhas loucuras, viagens e anseios com a experiência de qualquer coisa que não tenho, extraio disso uma destilação surreal. Escrevendo, sublimo essa coisa pelo ralo. A vagar por bueiros, ela encontra todo tipo de destilados da cidade, dos santos aos psicopatas. A amálgama humana se mistura, formando o mais intenso e real do pensamento e vai à superfície buscar as narinas dos transeuntes, mas são retidas pelas tampas dos bueiros que friamente censuram o regresso das idéias.
Bueiros paulistanos inspiram vozes destiladas..
7 de janeiro de 2013
Galho seco
Quando acordei de noite havia flores púrpuras no quintal.
Pétalas de primavera que se desprenderam de algum sumidouro.
E na dança da gravidade repousaram no chão seco
O vento vindo da rua lhes deu uma rodopiada divina.
Cada giro roçava o piso em um acorde doce de pés caminhando
Chacoalho do desassossego.
E cada giro girava dentro de mim fazendo pulsar o calor da estrada.
Uma pétala, um giro, uma saudade daquilo que um dia sonhei
Há tempo, muito tempo rodei de braços em braços
e no quintal vazio sobrou o uivo de um galho seco.
Quando eu desapareci esqueci de tudo.
A flor que me visita não é minha.
A roupa que vesti não me serve mais.
Caibo dentro de um frasco miúdo.
Minha história se evaporou em memórias dos outros
E o que se lembram de mim não é
nem o que sou nem o que fui.
É um fiapo de algo inexistente
Não é nada.
Fiz sonhos e planos para virar um resquício disforme.
Um fio de luz refratou o copo de café em borras de dor.
A casa é escura para quem acorda como se ainda dormisse.
Despertar todos os dias estrangeiro de si é dormir.
Terra de uma casa alugada infértil
A luz brotada se foi.
As pétalas roxas saíram de meus ramos
não há outra explicação.
Cada flor oferecida à uma paixão desnuda o caule
Sou a flora toda
Cada despedida arranca flores de mim
Sou um galho seco.
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Postado por
Vitor Machado
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