Bueiros paulistanos inspiram vozes destiladas..

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21 de janeiro de 2011

Receita para esquecer um grande amor




[17:51] Ela diz:
Você tem uma receita racional para esquecer alguém? Mas tem que ser uma receita boa, aplicável, que tenha certinho os componentes.

[17:52] Vitor diz:
Receita! Eu tenho, quer testar?

[17:52] Ela diz:
Eu quero, manda!

[17:52] Vitor diz:
Papel e caneta na mão

[17:52] Ela diz:
Ta na mão!

[17:52] Vitor diz:

Passo 1:
Pense na pessoa que quer esquecer com todas as coisas boas dela e teste até quanto seus sentimentos te levam a um grande vazio. Faça isso todos os dias com regularidade. De manhã, de tarde e a noite, por no mínimo 3 semanas. Se quiser anote em um papel e leve consigo uma lista das coisas boas que viveram, das qualidades da pessoa que um dia você gostou, admirou e exaltou.

Quando você começar a sentir que essas coisas todas que você lembrou durante este tempo são da pessoa ....claro pois você só lembrou porque pensou nela...mas NÃO SÓ dela e sim de você, pois foi você que lembrou e, sim das outras pessoas, pois elas podem ver as mesmas coisas. Aí você pode ir ao passo 2, mas tem de se obrigar a lembrar todos os dias por no mínimo 3 semanas. 3 vezes ao dia, são 21 vezes na semana, e 63 vezes de lembranças das coisas boas neste período.

Passo 2:
Guarde o papel de coisas boas que foi rascunhado na sua cabeça e faça o mesmo com as coisas que te incomodavam. Situações que você detestou aquela pessoa e os motivos pelos quais você teve asco. As coisas que você odiava, que te irritavam, que mexiam de forma ruim com você. Anote, leve na bolsa e a posologia será diferente. Sempre que você insistir em ver a pessoa como mais especial que sua própria natureza humana e social lhe implica, tire da carteira e lembre daquela situação ruim que essa pessoa “especial” lhe causou.
Se você tiver feito o passo 1 corretamente não será necessário o passo 2, mas mantenha-se firme. Independente do passo 2 ser necessário ou não há algo a ser feito que podemos chamar de passo “3 em diante” ou passo “3 para sempre”.

Passo 3 para sempre:
Sair com todos amigos e amigas que julgar serem seus amigos e amigas e conhecer os amigos de amigos e amigas que puder conhecer. Descubra todas as pessoas novas e tente reparar se há nelas qualidades e defeitos das suas listas anteriores (que a esta altura você deve saber decor). Nunca recuse convites de amigos e amigas ..... essas pessoas querem te ver por perto quando te convidam. Faça uma terceira lista das pessoas que você admira em QUALQUER pessoa e porque as admira. Pergunte as pessoas que admira se existem outras pessoas que não gostam delas e o porque. Você verá que, paradoxalmente, as pessoas que admira também são odiadas por outrem.

Após esse processo de conhecimento das pessoas espero que você perceba que o mundo é grande e que as coisas especiais não são eternas nem são sempre tão especiais quanto você julgou um dia.

E que de fato você NÃO deveria querer esquecer ninguém de sua vida e sim guardá-las delicadamente no olimpo dos seus pensamentos. As coisas boas que você viveu, e as ruins também, porque não? Afinal elas te fazem crescer.

Mas principalmente, espero que após os passos você perceba que não precisa de passo nenhum pra esquecer ninguém. Há muito o que viver e viver é uma experiência humana repleta de desacertos e felicidades e que enquanto o tempo correr e você estiver nele está se comprometendo a ir pra frente...... pois as coisas acontecem quando guardamos nosso aprendizado e não quando tentamos esquecer. Embora seja verdade que se esforçar pra lembrar de algo é bem perto de tentar esquecer....é também verdade que tentar esquecer a todo custo é uma forma de trazer a memória pra mais perto.

Esquecer é um ato antinatural. Nossa memória é assim, funciona pra lembrar.....melhor que qualquer esforço de esquecer é o esforço de viver.

[18:07] Ela diz:
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11 de janeiro de 2011

Quem é rebelde afinal? Jesus?

Era uma cidade pequena, até aí tudo bem, observemos bem. Mas em Medópolis tinha-se a sensação de olhos e ouvidos espelhados em cada poste. As pessoas tinham todos os dias na padaria, na igreja ou no ponto de taxi as mais diferentes e inusitadas histórias dos moradores daquele distrito. Não sei bem se tratavam-se de fatos ou falácias de um povo provinciano sem muito o que discutir senão os acontecimentos diminutos da vida dos outros. Mas devo dizer que muito ali era de certa forma verdade. Falo isso pois conheci Gabriel.

Por um desses encontros e desencontros do acaso Gabriel fora parar em Medópolis. Parte de sua educação advinha das escolas alternativas, vestia-se de um jeito peculiar, não acreditava em deus, e como se não bastasse usava camisas com dizeres do tipo “vai se fuder você que está lendo”. Tinha um gosto musical diferente, e certa proximidade com narcóticos, nicóticos e alcoóis. Bastou Gabriel chegar a cidade para se tornar conhecido. Um estranho ao modo de vida ali estabelecido. Fora tomado como rebelde pelas cercanias. Agora o que muitos não sabiam era que de rebelde Gabriel não tinha nada, era fruto de uma educação, era diferente talvez, hábitos diferentes, estilo diferente. Mas comprava coturnos como outros compram tênis e sandálias. Comprava pinga como outros compram vinho e cerveja. Comprava CDs das músicas favoritas como os outros faziam. Comprava como os outros compram, nada de diferente amigo leitor. De anjo ele não tinha nada, pelo menos que justificasse o anjo decaído. rs. E embora fosse repleto de discurso, tinha uma boa vida e certo desfrute dela. E sem notar pisava em seu discurso como uma criança aprendendo a andar.

Mas se fosse só isso estaria tudo bem, as pessoas achariam que aquele adolescente era rebelde, ele saberia que não era, era parte do mundo e vivia sob as mesmas regras sem infringi-las. Problema é que o adolescente Gabriel achou-se de fato alguém rebelde. Se achou em condições de persuadir pessoas áquilo cuja própria consciência frágil não acreditava. E como fizera Jesus milênios antes tornou-se um pregador às mentes acomodadas, entediadas e ansiosas por novidade. E assim como nosso rebelde Inri conseguiu ser ouvido, ganhou amigos, status e seguidores, por assim dizer. E se me permitem a continuação desta comparação, ambos falavam sobre aquilo que somente eles achavam correto. Claramente uma postura até certo ponto egocêntrica, mas aí sim uma grande diferença entre os dois: a benevolência? Os milagres? A cruz? Não, a única diferença entre os dois é que um veio depois do outro.

E Medópolis tinha olhos atentos, eram os olhos de cristo estampados na torre da igreja e nas pupilas dos transeuntes. E aquele garoto mimado só podia ser considerado um rebelde. Agora um rebelde com seguidores, é verdade. Mas como qualquer garoto mimado quando se excede a cota que o ego é capaz de suportar, a sensação de possuir as verdades se transforma na soberba da razão. Imagine, pois, um adolescente como Gabriel conseguir coisas por meio de suas palavras. E conseguiu, muitas coisas boas, já que qualquer diferença ali podia ser considerada benévola. Coisas ruins também, as mesmas aliás, vista por olhos de uns ou de outros. Mas da mesma forma que chegou Gabriel foi embora, deixou um legado no jeito das pessoas e na sensação de alívio das mães carmelitas.

Gabriel nunca fora rebelde, Jesus nunca fora rebelde, não subverteram regra nenhuma, eram mimados e diferentes e o diferente choca. O que os tornou um ou outro foram os olhos que os viram, a quantidade de seguidores e do que eles eram capazes. Simples, da próxima vez que encontrar alguém muito diferente que se julgar rebelde, lembre-se que ele pode ser mimado. Quem é rebelde afinal? O diferente em que sentido, quem subverte as regras ou que as usa para se benefício? Quem vive no mundo e tenta mudá-lo ou quem se mantem parado enquanto o mundo se transforma? Quem esta parado neste caso? Os olhos? Jesus? Gabriel? Eu? Você? É hora de repensarmos a rebeldia. O que você acha?



***texto da coluna de Janeiro na revista O que?***

O lado de dentro...sublime

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