Ofereço este texto a um nobre amigo.
Personagens
Breton (31 anos)
Nicolau (21 anos)
Raul (20 anos)
Glória (21 anos)
Virgínia (24 anos)
Cenário:
Ponte Cruzeiro do Sul, marginal Tietê, São Paulo.
Ato único
Cena 1
Estão os cinco debruçados no parapeito da ponte, olhando o rio Tietê. Breton e Glória de mãos dadas, ele fumando compulsivamente, ela arrumando o cabelo periodicamente. Virgínia, quieta, observando algumas manchas no rio. Raul com uma garrafa de vinho em uma das mãos e um cigarro em outra e Nicolau com tiques de passar a mão na cabeça.
BRETON: Não acho que seja assim a vida, as pessoas têm consciência do que fazem, existe uma ética de querer o bem independente de religião. A alma é boa em si só.
RAUL: (dando um gole) Por que você tá falando isso? A gente tá falando do filme que passou ontem.
BRETON: Porque é isso. Você não acha?
RAUL: Sei lá. Não quero pensar nisso agora.
BRETON: (exaltado): Tá com preguiça de pensar! Por isso que você num faz porra nenhuma, num pensa também.
RAUL: (assustado): Você tá bem Breton? Você tá tremendo. Não acho que seja assim também. É que a gente tava falando do filme e você vem com esse papo.
VIRGÍNIA: Eu acho, sabe Ni, que isso aqui é uma visão bonita. Apesar de não parecer, reflete muitas coisas.
GLORIA: É mesmo bem, você está tremendo.
BRETON: Olha o que tá tremendo aqui (segura o saco). Eu tô aqui falando de uma coisa que, se vocês não perceberam, trouxe a gente e o ser humano até os dias de hoje.
NICOLAU: Olha isso, um monte de lixo, o cheiro de podre, carniça, é uma das piores coisas de se ver. É o reflexo da degradação da humanidade. Credo, não sei como você consegue ver beleza nisso.
RAUL: Como assim, trouxe o ser humano até aqui? Que merda é essa que você está falando?
VIRGÍNIA: Mas é aí que está a grande jogada Nicolau. É lindo ver como a humanidade chegou até aqui. Á beleza no podre. Olha só, milhares e milhares de anos, de descobertas, de ciência e um monte de coisa que a humanidade criou e hoje ela se questiona sobre poluição. Não é lindo isso? Eu acho demais.
NICOLAU: Acho que eu não entendi, mas é feio, tô vendo e é feio. Esse papo aí de poluição é foda também. Deve ter merda nossa aí em baixo, você não acha?
BRETON: Puta que o pariu Raul (acende um cigarro). Imagina só, lá no Japão, há muito tempo atrás, eles sempre respeitaram a natureza e uns aos outros. Tinha aquele lance de honra, de tirar o dedinho fora. Isso é respeito Raul, a alma do japonês é mais sincera.
RAUL: Eita, agora que eu não entendi nada. Acho que você tá meio louco.
VIRGÍNIA: Noooossa, sabe que eu não tinha pensado nisso. Que legal, tem merda de São Paulo inteira aí dentro. Quanta merda, isso aqui é uma mina de merda. Riquíssima em matéria orgânica. Tô até emocionada. Imagina só, todo esse rio tem merda que um dia foi de alguém, de pedreiro, de porteiro, de madame, de professor, de camelô, de patricinha, de estudante, de ladrão...e tão todas elas lá, passando uma do lado da outra sem complicação...que demais...
(levanta e grita) VIVA A DEMOCRACIA DAS MERDAS!!!!
GLÓRIA: Ih, tá doidona a Virgínia.
BRETON: Fica quieta Glória!
RAUL: Isso.
BRETON: A alma é desprendida disso tudo. Ela não faz juízo de valores, é universal Raul, os japoneses eram hierárquicos na sociedade, mas respeitavam a alma dos outros. Você nunca viu caras importantes se curvarem diante de camponeses. Isso é respeito, Raul, as almas são um caso à parte.
RAUL: Puta!! Que legal, acho que entendi o que você ta dizendo.
VIRGÍNIA: Viva a democracia das merdas!!!
NICOLAU: Bacana esse seu raciocínio, hein, Virgínia. As merdas são francesas. “Libertê, igualitê e fraternitê”.
VIRGÍNIA: Viva a democracia das merdas.
RAUL: Se as merdas são francesas, as almas são japonesas. (brado) Viva a democracia das almas!!!!
GLÓRIA: Viva!!
BRETON: (brado) Viva a comunhão das almas com as merdas!!!!
NICOLAU: Viva o Igualitê de la merdê!!!! E a merda do Tietê!!!
GLÓRIA: E a alma do japonês da feira.
VIRGÍNIA: E nossas merdas e nossas almas que estão aqui em baixo no Tietê!!!!
NICOLAU: Viva o Tietê!!!
GLÓRIA e BRETON: Viva o Tietê!!
RAUL e NICOLAU: Viva o Tietê!!!
TODOS: (brado) Viva o Tietêêêê!!!! Tietêêê...Tietêêêê
Cena 2
Virgínia e Breton andando na rua, abraçados, ambos com garrafas de vinho nas mãos.
VIRGÍNIA: (ergue a garrafa) Viva!! Viva o Tietê
BRETON: Merdêê!!!
VIRGÍNIA: Ehhhh
(silêncio)
VIRGÍNIA: Não achei que eles teriam coragem de pular no rio.
BRETON: Se a gente teve, por que eles não teriam? Sabe Virgínia, eu tô tão feliz.
VIRGÍNIA: Sabe que eu também, tô aliviada....Gritar faz bem.
BRETON: É verdade.
AMBOS: Viva!!!
(risadas e gargalhadas)
(silêncio, um olha para o outro. Um dos dois diz:)
????: Você tem tomado seu remédio?
????: Não. Não acredito mais naquele psiquiatra. E me dava muito sono aquele remédio.
????: Parou de vez então.
????: É, mas tô muito bem. Olha só, hoje, quantas coisas legais a gente descobriu.
????: Verdade. Isso é muito bom.
????: Demais.
AMBOS: Viva!!!!!!
Personagens
Breton (31 anos)
Nicolau (21 anos)
Raul (20 anos)
Glória (21 anos)
Virgínia (24 anos)
Cenário:
Ponte Cruzeiro do Sul, marginal Tietê, São Paulo.
Ato único
Cena 1
Estão os cinco debruçados no parapeito da ponte, olhando o rio Tietê. Breton e Glória de mãos dadas, ele fumando compulsivamente, ela arrumando o cabelo periodicamente. Virgínia, quieta, observando algumas manchas no rio. Raul com uma garrafa de vinho em uma das mãos e um cigarro em outra e Nicolau com tiques de passar a mão na cabeça.
BRETON: Não acho que seja assim a vida, as pessoas têm consciência do que fazem, existe uma ética de querer o bem independente de religião. A alma é boa em si só.
RAUL: (dando um gole) Por que você tá falando isso? A gente tá falando do filme que passou ontem.
BRETON: Porque é isso. Você não acha?
RAUL: Sei lá. Não quero pensar nisso agora.
BRETON: (exaltado): Tá com preguiça de pensar! Por isso que você num faz porra nenhuma, num pensa também.
RAUL: (assustado): Você tá bem Breton? Você tá tremendo. Não acho que seja assim também. É que a gente tava falando do filme e você vem com esse papo.
VIRGÍNIA: Eu acho, sabe Ni, que isso aqui é uma visão bonita. Apesar de não parecer, reflete muitas coisas.
GLORIA: É mesmo bem, você está tremendo.
BRETON: Olha o que tá tremendo aqui (segura o saco). Eu tô aqui falando de uma coisa que, se vocês não perceberam, trouxe a gente e o ser humano até os dias de hoje.
NICOLAU: Olha isso, um monte de lixo, o cheiro de podre, carniça, é uma das piores coisas de se ver. É o reflexo da degradação da humanidade. Credo, não sei como você consegue ver beleza nisso.
RAUL: Como assim, trouxe o ser humano até aqui? Que merda é essa que você está falando?
VIRGÍNIA: Mas é aí que está a grande jogada Nicolau. É lindo ver como a humanidade chegou até aqui. Á beleza no podre. Olha só, milhares e milhares de anos, de descobertas, de ciência e um monte de coisa que a humanidade criou e hoje ela se questiona sobre poluição. Não é lindo isso? Eu acho demais.
NICOLAU: Acho que eu não entendi, mas é feio, tô vendo e é feio. Esse papo aí de poluição é foda também. Deve ter merda nossa aí em baixo, você não acha?
BRETON: Puta que o pariu Raul (acende um cigarro). Imagina só, lá no Japão, há muito tempo atrás, eles sempre respeitaram a natureza e uns aos outros. Tinha aquele lance de honra, de tirar o dedinho fora. Isso é respeito Raul, a alma do japonês é mais sincera.
RAUL: Eita, agora que eu não entendi nada. Acho que você tá meio louco.
VIRGÍNIA: Noooossa, sabe que eu não tinha pensado nisso. Que legal, tem merda de São Paulo inteira aí dentro. Quanta merda, isso aqui é uma mina de merda. Riquíssima em matéria orgânica. Tô até emocionada. Imagina só, todo esse rio tem merda que um dia foi de alguém, de pedreiro, de porteiro, de madame, de professor, de camelô, de patricinha, de estudante, de ladrão...e tão todas elas lá, passando uma do lado da outra sem complicação...que demais...
(levanta e grita) VIVA A DEMOCRACIA DAS MERDAS!!!!
GLÓRIA: Ih, tá doidona a Virgínia.
BRETON: Fica quieta Glória!
RAUL: Isso.
BRETON: A alma é desprendida disso tudo. Ela não faz juízo de valores, é universal Raul, os japoneses eram hierárquicos na sociedade, mas respeitavam a alma dos outros. Você nunca viu caras importantes se curvarem diante de camponeses. Isso é respeito, Raul, as almas são um caso à parte.
RAUL: Puta!! Que legal, acho que entendi o que você ta dizendo.
VIRGÍNIA: Viva a democracia das merdas!!!
NICOLAU: Bacana esse seu raciocínio, hein, Virgínia. As merdas são francesas. “Libertê, igualitê e fraternitê”.
VIRGÍNIA: Viva a democracia das merdas.
RAUL: Se as merdas são francesas, as almas são japonesas. (brado) Viva a democracia das almas!!!!
GLÓRIA: Viva!!
BRETON: (brado) Viva a comunhão das almas com as merdas!!!!
NICOLAU: Viva o Igualitê de la merdê!!!! E a merda do Tietê!!!
GLÓRIA: E a alma do japonês da feira.
VIRGÍNIA: E nossas merdas e nossas almas que estão aqui em baixo no Tietê!!!!
NICOLAU: Viva o Tietê!!!
GLÓRIA e BRETON: Viva o Tietê!!
RAUL e NICOLAU: Viva o Tietê!!!
TODOS: (brado) Viva o Tietêêêê!!!! Tietêêê...Tietêêêê
Cena 2
Virgínia e Breton andando na rua, abraçados, ambos com garrafas de vinho nas mãos.
VIRGÍNIA: (ergue a garrafa) Viva!! Viva o Tietê
BRETON: Merdêê!!!
VIRGÍNIA: Ehhhh
(silêncio)
VIRGÍNIA: Não achei que eles teriam coragem de pular no rio.
BRETON: Se a gente teve, por que eles não teriam? Sabe Virgínia, eu tô tão feliz.
VIRGÍNIA: Sabe que eu também, tô aliviada....Gritar faz bem.
BRETON: É verdade.
AMBOS: Viva!!!
(risadas e gargalhadas)
(silêncio, um olha para o outro. Um dos dois diz:)
????: Você tem tomado seu remédio?
????: Não. Não acredito mais naquele psiquiatra. E me dava muito sono aquele remédio.
????: Parou de vez então.
????: É, mas tô muito bem. Olha só, hoje, quantas coisas legais a gente descobriu.
????: Verdade. Isso é muito bom.
????: Demais.
AMBOS: Viva!!!!!!